Reforma Tributária do Consumo: o que muda para o setor de seguros a partir de 2026

Setor de seguros e resseguros enfrenta o desafio de se adaptar às mudanças trazidas pela cobrança do IBS e da CBS a partir de 2026
por Tiago Rios Coster publicado em 29/04/2025

Com a promulgação da Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a Reforma Tributária do Consumo prevista pela Emenda Constitucional nº 132/2023, o setor de seguros brasileiro entra em um novo ciclo do ponto de vista tributário, com novos desafios de adaptação e implementação às novas regras, alterando de forma significativa a dinâmica tributária das seguradoras e resseguradoras.

O que a reforma tributária do consumo representa?

O pilar da reforma é a instituição do novo “IVA dual” no Brasil, representado pelo Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, de competência compartilhada entre Estados, Distrito Federal e Municípios, e pela Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS, de competência da União. 

Como se sabe, os dois novos tributos, IBS e CBS, de legislação unificada e idêntica, substituirão nos próximos anos as atuais contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS), de competência da União, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência dos estados e do Distrito Federal, e o Imposto sobre Serviços (ISS), de competência dos municípios e do Distrito Federal.

Como funciona a tributação atual no setor de seguros?

Atualmente, a atividade de fornecimento de seguros enfrenta um regime de múltipla incidência tributária, composto por:

Vale destacar que o setor de seguros travou discussões judiciais para definição da amplitude da base de cálculo. Até a vigência da Lei nº 12.973/2014, a base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS no regime cumulativo era definida como o faturamento da pessoa jurídica, conforme o art. 2º da Lei nº 9.718/1998, o que pressupunha a venda de bens ou prestação de serviços. Para as seguradoras, que não realizam venda de bens ou prestação de serviços nos moldes tradicionais, havia dúvidas sobre quais receitas deveriam compor essa base de cálculo.

Em 12/06/2023, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário nº 400.479, decidindo que os prêmios de seguros devem ser incluídos na base de cálculo das contribuições, pois constituem receitas operacionais típicas das seguradoras., ou seja, decorrentes de sua atividade principal; e que as receitas financeiras de aplicações das reservas técnicas não devem ser incluídas na base de cálculo dessas contribuições, por não serem consideradas receitas operacionais típicas das seguradoras, sendo reflexos de uma imposição legal (a exigência regulatória de constituição das reservas).

Das receitas obtidas através dos prêmios de seguros, admite-se a exclusão ou dedução do valor referente às indenizações correspondentes aos sinistros ocorridos, efetivamente pago, deduzido das importâncias recebidas a título de cosseguro e resseguro, salvados e outros ressarcimentos (art. 3º, § 6º, inciso II, da Lei nº 9.718/1998).

  • IOF: imposto federal aplicado sobre os prêmios de seguros com alíquotas variadas conforme o tipo de cobertura.
  • ISS: destaca-se que no modelo atual não há incidência do tributo municipal sobre seguros, uma vez que a atividade securitária é regulada por legislação própria e não consta da lista de serviços tributáveis pelo ISS (anexo da Lei Complementar nº 116/2003).

O novo regime: CBS e IBS com regime específico para seguros e resseguros

A partir da Lei Complementar nº 214/2025, as operações de seguros e resseguros passam a ser tributadas pelo IVA dual: CBS (federal) e IBS (estadual/municipal), conforme regime específico para serviços financeiros – à exceção de seguros de saúde –, conforme explicado adiante.

Destaca-se que, ao passo que no modelo atual não se considera a atividade de seguros como um serviço, daí não incidindo o ISS, para a nova legislação da CBS e do IBS qualquer fornecimento econômico sujeita-se à incidência dos tributos, alcançando, portanto, os prêmios de seguro e resseguros. Essa alteração de modelo tributário com base de incidência ampla é um dos fatores que irá tornar a comercialização de seguros mais onerosa do ponto de vista tributário, já que antes não era alcançada pelo ISS ou ICMS, mas apenas PIS e COFINS na sistemática cumulativa, além do IOF.

Por outro lado, a partir de 2027 fica extinto o IOF sobre operações de seguro, conforme previsão do art. 3º da Emenda Constitucional nº 132/2023. Referida alteração constitucional, que introduziu a reforma tributária, alterou o art. 153, inciso V, da CF/1988 para retirar “seguros” da competência do IOF, com vigência a partir de 01º/01/2027.

A base de cálculo da CBS e do IBS para seguros e resseguros inclui as: 

  • Receitas auferidas com prêmios de seguros, de cosseguros aceitos, de resseguros e de retrocessão;
  • Receitas financeiras dos ativos financeiros garantidores de provisões técnicas, na proporção das receitas de prêmios que não geram créditos de IBS e CBS para os adquirentes frente às receitas totais.

Do montante das referidas receitas, admitem-se as seguintes deduções:

  • as despesas com indenizações referentes a seguros de ramos elementares e de pessoas sem cobertura por sobrevivência, exclusivamente quando forem referentes a segurados pessoas físicas e jurídicas que não forem contribuintes do IBS e da CBS sujeitas ao regime regular, correspondentes aos sinistros, efetivamente pagos, ocorridos em operações de seguro, depois de subtraídos os salvados e os demais ressarcimentos;
  • os valores pagos referentes e restituições de prêmios que houverem sido computados como receitas, inclusive por cancelamento;
  • os valores pagos referentes aos serviços de intermediação de seguros e resseguros;
  • os valores pagos referentes ao prêmio das operações de cosseguro cedido; e
  • as parcelas dos prêmios destinadas à constituição de provisões ou reservas técnicas referentes a seguro resgatável.

Destaca-se que a apuração da base de cálculo, na forma acima determinada, se dá pelo regime de caixa, ou seja, à medida do efetivo recebimento das receitas e quando efetuadas as deduções admitidas. 

Na hipótese de a base de cálculo apresentar valor negativo, a seguradora poderá deduzir o valor negativo, sem qualquer atualização, das bases de cálculo positivas dos períodos de apuração posteriores, até o período de cinco anos.

Sobre a referida base de cálculo, mensalmente apurada, aplicam-se as alíquotas de IBS e CBS determinadas para as operações de serviços financeiros, ainda não definidas, conforme procedimento previsto no art. 233 da Lei Complementar nº 214/2025, a serem divulgadas pelo Comitê Gestor, no caso do IBS, e pela União, no caso da CBS.

As seguradoras podem apurar créditos de IBS e CBS sobre aquisições de bens e serviços sujeitos à incidência dos tributos, descontando-os dos valores devidos ao final do período de apuração. A única vedação é quanto à apropriação de créditos sobre valores que porventura sejam deduzidos na formação na base de cálculo do serviço financeiro, vedando-se que uma mesma materialidade seja deduzida em duplicidade (na formação da base de cálculo e como crédito de IBS e CBS). 

A própria legislação prevê que, por parte dos segurados, as indenizações recebidas não estão sujeitas à incidência do IBS e da CBS e não permitirão a apropriação de créditos de IBS e CBS.

Ainda, as operações de resseguro e retrocessão ficam sujeitas à incidência à alíquota zero, inclusive quando os prêmios de resseguro e retrocessão forem cedidos ao exterior.

Além das obrigações acessórias de caráter geral, as seguradoras deverão apresentar às autoridades fiscais informações contendo a identificação dos segurados ou, caso os segurados não sejam identificados na contratação do seguro, dos estipulantes e os valores dos prêmios pagos por cada um;

Recomendações para o setor na adaptação ao novo sistema de tributação

Diante das modificações trazidas, é essencial que as sociedades seguradoras tenham suas atividades minuciosamente mapeadas, em especial quanto à qualificação dos segurados como sendo ou não contribuintes de IBS ou CBS. Como visto, na formação da base de cálculo, é indispensável ter conhecimento das operações prestadas que geram créditos para os adquirentes.

Isso leva à necessidade de adaptação dos sistemas utilizados desde a venda até a efetiva operacionalização das atividades, com especial atenção para os sistemas que gerenciam a apuração dos tributos devidos e o preenchimento de obrigações acessórias.

Ainda, de forma geral, considerando a modificação de custos tributários, a revisão de contratos com fornecedores e com os próprios clientes se torna essencial para garantir a manutenção de margens de lucro sobre as receitas auferidas, em especial diante de contratos de prazo mais longo e que serão afetados pela transição para o novo regime tributário.

Por: Tiago Rios Coster (tiago@charneski.com.br)

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