IRPJ/CSLL – SUBVENÇÕES PARA INVESTIMENTO – MP 1.185/23
Medida Provisória traz potencial aumento da carga tributária sobre benefícios fiscais
por Charneski Advogaados publicado em 26/09/2023Editada em 30/08/2023, a Medida Provisória nº 1.185 modifica a tributação dos incentivos fiscais caracterizados como subvenções para investimento, para fins da incidência do Imposto sobre a Renda de Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
É preciso dar um passo para trás para entender os motivos e o verdadeiro objeto das alterações trazidas por essa Medida Provisória, bem como seus prováveis impactos.
Conforme já examinado em nosso Portal, em 26/04/2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou os recursos repetitivos representativos do Tema 1.182, que tratavam da possibilidade de os contribuintes detentores de benefícios fiscais de ICMS – como redução de base de cálculo, diminuição de alíquota, isenção, diferimento, entre outros – excluírem os respectivos valores das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, independentemente do seu tratamento como subvenção para investimento, nos termos do art. 30 da Lei nº 12.973/2014.
A discussão se deu na sequência dos julgamentos realizados em 08/11/2017 e 14/04/2021 pela Primeira Seção do STJ (EREsp 1.517.492/PR e EREsp 1.443.771/RS), por meio dos quais se decidiu que incentivos classificados como crédito presumido de ICMS poderiam ser excluídos das bases de cálculos do IRPJ e da CSLL, sob pena de violação ao pacto federativo. Naquelas ocasiões, a decisão não condicionou a referida exclusão à consideração do benefício enquanto uma subvenção para investimento e ao cumprimento dos requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/2014 – sobretudo a destinação dos valores do subsídio à reserva de incentivos fiscais, vedada a sua distribuição a sócios ou acionistas da pessoa jurídica.
Contudo, ao julgar o Tema 1.182, acerca dos demais benefícios fiscais (isenções, reduções de alíquotas ou bases de cálculo e diferimentos), o STJ fixou 3 entendimentos:
- os benefícios fiscais de ICMS não caracterizados como créditos presumidos de ICMS, tais como redução de base de cálculo, diminuição de alíquota, isenção, diferimento, dentre outros, somente podem ser deduzidos das bases de cálculos do IRPJ e da CSLL se cumpridos os requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/2014;
- para esses não deve ser exigida a demonstração de “concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos”, exigência que a Receita Federal do Brasil vinha fazendo; e
- a Receita Federal do Brasil poderá fiscalizar o cumprimento dos requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/2014, a fim de verificar se os valores subvencionados não foram utilizados em finalidade estranha ao empreendimento econômico.
Agora, a Medida Provisória nº 1.185/2023 vem para mitigar os efeitos orçamentários da possibilidade de exclusão dos incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Com nítida intenção arrecadatória, a medida proposta pelo Executivo propõe três principais alterações: (i) criação de uma nova modalidade de desoneração – o “crédito fiscal” de IRPJ – para empresas que se beneficiam de subvenções de ICMS; (ii) limitação da utilização do crédito por meio de uma série de procedimentos e requisitos formais, destinados a aferir a natureza de “subvenção para investimento” do benefício fiscal; e (iii) revogação do art. 30 da Lei 12.973, o qual previa a possibilidade de exclusão das subvenções da base de cálculo da tributação federal, tal como interpretado pelo STJ.
Quanto à primeira alteração, o art. 2º, III, da MP nº 1.185/2023, traz a síntese das características do referido crédito. Trata-se de um crédito de IRPJ, que será concedido aos contribuintes que realizarem comprovada implantação ou expansão de empreendimentos por meio de um benefício fiscal de provido por algum ente federativo (Estados-membros, Distrito Federal e Municípios).
Ou seja, os contribuintes que obtiverem receita de subvenções estatais poderão se habilitar para apurar um crédito de 25% (IRPJ e o respectivo adicional) sobre esse montante. Esse crédito poderá ser objeto de compensação com débitos tributários federais ou ressarcimento em dinheiro, após a entrega da ECF na qual esteja demonstrado o direito creditório, e apenas a partir do ano-calendário seguinte ao do reconhecimento das receitas de subvenção.
Além disso, o crédito fiscal traz também outra restrição temporal importante: para sua apuração, somente poderá ser computadas as receitas de subvenção que estejam relacionadas com a implantação ou a expansão do empreendimento econômico.
A apuração do referido crédito também conta com algumas especificidades trazidas no bojo da MP. O art. 8º disciplina que as despesas de depreciação, amortização ou exaustão do projeto não serão computadas na apuração do crédito, além dos valores das subvenções que já tenham sido objeto de exclusão da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Quanto à segunda alteração, o art. 4º da MP nº 1.185/2023 traz requisitos para que as empresas possam usufruir desse direito (habilitação): (i) ser beneficiária de subvenção para investimento concedida por ente federativo; (ii) que o ato concessivo da subvenção seja anterior à data de implantação ou de expansão do empreendimento econômico; e (iii) que o ato concessivo da subvenção estabeleça expressamente as condições e contrapartidas que devem ser observadas em relação à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.
Quanto à terceira alteração, em verdade, trata-se da modificação decorrente da implementação desse modelo do crédito fiscal.
Isso porque, a nova Medida Provisória revoga o art. 30 da Lei nº 12.973/2014, que, além de ter equiparado todo e qualquer incentivo de ICMS como subvenção para investimento, previa a não- incidência do IRPJ e da CSLL sobre esses valores renunciados pelos Estados-membros às empresas, sendo objeto de interpretação pelo STJ.
Essa substituição do regime do art. 30 da Lei nº 12.973/2014 pela MP nº 1.185/2023 leva a uma série de conclusões:
- Aumento da carga tributária para empresas que recebem algum tipo de benefício fiscal de ICMS, tendo em vista que passam a calcular um crédito apenas sobre o IRPJ (15% + 10% de adicional), sem incluir as alíquotas de 9% a título de CSLL;
- Dificuldade de efetiva comprovação dos requisitos como a implantação ou comprovação do empreendimento econômico;
- Problemática temporal em relação à utilização do crédito, pois esta fica condicionada à conclusão do projeto de implantação ou expansão do empreendimento.
Portanto, as mudanças introduzidas pela Medida Provisória nº 1.185/2023 projetam para o futuro um ambiente de incerteza para as empresas beneficiadas pelas recentes decisões do STJ, já que muitas dessas alterações conflitam com as teses estabelecidas pela Corte.
Nesse passo, cumpre destacar que as alterações trazidas, caso aprovadas, passariam a produzir efeitos apenas a partir de 01º/01/2024. Além disso, a MP perderá seus efeitos caso não seja convertida em lei no prazo de 120 dias, contados de sua publicação. Cogita-se até mesmo de substituição do texto da Medida Provisória por um Projeto de Lei, que possa ser aperfeiçoado pelo Congresso Nacional.
Caso aprovado texto da MP nº 1.185/2023 da forma em que se encontra, desde já se antevê uma série de novos litígios, tais como: a) possibilidade de se tributar subvenções como renda ou receita, quando teriam a natureza jurídica de meras transferências patrimoniais; b) ausência de atualização monetária do crédito fiscal do IRPJ; e c) violação ao pacto federativo na tributação de créditos presumidos de ICMS, ainda que não cumpridos os requisitos da MP, tendo em vista a jurisprudência consolidada do STJ.
Autor:
Rubem Rodrigues Soares Neto (rubem@charneski.com.br)